Monday, April 10, 2006

Enquanto isso, na Sala da Justiça...

Não canso de me surpreender com advogados. Advogados se tornaram os publicitários do Direito. A maioria desapegou-se da lei. Ao invés de buscar argumentos jurídicos para convencer juízes, jurados e tribunais de que o cliente tem sempre razão....escolheu o uso das idéias criativas, mirabolantes, inéditas. Traduzindo: boa parte da categoria tem preguiça de estudar. Estudar pra quê? Geralmente, quem paga os serviços de um advogado é leigo em Direito. Não sabe a diferença, por exemplo, entre legítima defesa e estrito cumprimento de dever legal (muitos advogados também ignoram, apesar de quatro ou cinco anos de faculdade). Mas aquele que contrata um advogado procura segurança, não aulas sobre as centenas de artigos que os códigos e as leis enumeram. Então, ser atendido por um terno engravatado, em um escritório com carpete e secretária de voz macia....são os requisitos que bastam para o incauto entregar seu futuro, sua liberdade e até sua vida nas mãos de um desconhecido que usa anel no dedinho. Ah. E, fundamentalmente, entregar seu dinheiro.
Ontem, a televisão exibiu entrevista com Suzane, a ré mais famosa do Brasil. Matou os pais. Menina rica. Orientada por seus bem pagos advogados, Suzane apareceu diante das câmeras vestindo camisetinha da Minie (minha cachorra tem uma parecida), pantufas de coelhinhos e cabelo enfeitado como arraial de festa junina: vários lacinhos e fivelas coloridas prendendo fios falsamente loirinhos. Se a mocinha de 22 anos pintasse as bochechas de vermelho e saísse na rua, certamente não seria reconhecida ou agredida pela população revoltada. Qualquer um a confundiria com a boneca Emília, a do Sítio. Suzane chorou lágrimas de crocodilo e conversou com a repórter simulando voz infantil. Constrangedor. Farsa escancarada. A TV nem precisaria ter mostrado a cena em que, distraído, o advogado explica a Suzane como responder às perguntas. O doutor esqueceu que o microfone pregado na roupa da cliente já estava ligado....
Resultado: ao contrário de comover, os advogados conseguiram aumentar o índice de rejeição da garota. Foi presa novamente hoje....
Suzane dispõe de grana para financiar sua defesa. Terminou como "vítima" de profissionais que ensaiam roteiros, enquanto deveriam exercitar argumentação jurídica. E quem não tem dinheiro? É defendido de que forma? Com muito descaso, segundo eu vejo diariamente no Fórum.
Em Júri, já presenciei réu agarrado à Bíblia, terço enrolado nos dedos, ajoelhado no chão com o olhar fixo no Cristo pregado na parede. Um pecador arrependido? Não, um pecador travestido por um advogado sem noção do ridículo.
Já li, espantada, um pedido de liberdade provisória subscrito por advogado que pedia a soltura do cliente, traficante. Explicava que a Lei de Crimes Hediondos proibia que fosse concedida a liberdade provisória em caso de tráfico ilícito de drogas. Contudo, a lei era expressa: ao crime era vedada a liberdade.....não ao autor do crime!!! Ou seja, o rapaz poderia ganhar as ruas, caso o...ahnn...."crime" continuasse a jogar truco com os demais detentos lá na carceragem. Vergonhoso.
Em um processo no qual o réu era acusado de ter estuprado, em uma noite, quatro vezes uma mulher, saiu a seguinte "pérola": não foi estupro, e sim um crime impossível. Pois "nenhum homem teria potência para tanto". Promotores (homens) se juntaram em torno dos autos para comentar sobre a pobre vida sexual da advogada que havia elaborado a tese. Meninos....
As aberrações continuam em delitos de menor gravidade. Homem que furta em supermercado garrafa de uísque. E mulher que, em farmácia, enfia creme de beleza dentro da bolsa. Defesa? "Estado de necessidade". Afinal de contas, nem só de pão e água vive o homem. E amenizar as rugas do rosto é realmente uma necessidade feminina....
A inventividade de certos advogados extravasa o texto escrito. Uma vez, chegou nas minhas mãos um pedido de indenização trabalhista.....em formato de história em quadrinhos! O advogado desenhou o cliente, na frente do cruel patrão, ouvindo a demissão de cabeça baixa. Desenhou o cliente entrando no barraco onde morava e contando o ocorrido à eposa, que segurava um nenê nos braços (sobre o qual foi colocado um balãozinho contendo a palavra "buá"). O último quadrinho da historinha era o desenho do próprio advogado, segurando uma folha que estampava seu número de inscrição na OAB. Sem comentários.

Advogados. Tomara que você nunca precise de um.

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