Thursday, October 26, 2006

Chagais



“So you´ll aim toward the sky
And you´ll rise high today
Fly away
Far away
Far from pain”
(Grandaddy)

Qual é o nome?
Acho que ninguém batizou.
Talvez porque sejamos poucos. Será?
Estou falando de nós, admiradores convictos de bandas como Grandaddy, Mercury Rev, Flaming Lips, Secret Machines, Sparklehorse. Ou seja, fãs de gente que, no século XXI, tratou guitarras, baixos, teclados e baterias com tamanha delicadeza e cuidado....que o rock se fundiu às cantigas. De camponeses modernos e caipiras que, sem disfarçar a pronúncia rural, cantam e contam histórias místicas de gigantes apaixonados por sereias, peixes e sapos caídos como chuva do céu, riachos de prata que encerram segredos, princesas enfeitiçadas transformadas em unicórnios, espectros que pairam sobre telhados, aranhas que fiam teias de pérolas. Enfim, de melodias e letras que já compõem um cancioneiro....sem denominação.
Injusto. Só porque já passamos, em nossa maioria, dos trinta anos? Ou porque tais bandas não são blockbusters de mídia como, por exemplo, os representantes da atual geração dos moleques com rímel escorrido pelo choro? Quem é adolescente, está na casa dos 20 ou lota o I-Pod com as lamúrias de grupos como Chemical Romance e congêneres...é emo. E nós? Somos o quê? Se não tem nome, tomo a liberdade de inventar um. Mas deve ser um termo que sirva para identificar todas as bandas "oníricas". Que traga à lembrança algo que seja comum tanto aos veteranos do Sparklehorse como aos caçulas do Secret Machines. Algo....ou alguém. Então, duas pessoas. Dois pintores: Marc Chagall e Odilon Redon. Pois o russo e o francês, já falecidos, se anteciparam ao rock "poeira de estrelas"; rabiscaram, pincelaram e coloriram todas as canções mágicas, sensacionais e sensoriais que seriam criadas a partir do final do século passado por Mercury Rev e companhia. Até então, o rock andava de mãos dadas com a pintura do desespero. "Creeps" rastejantes e vampiros torturados haviam saltado das telas sombrias de William Blake, Goya, Hieronymus Bosch e invadido os pesadelos de Thom Yorke, vocalista do Radiohead, e do príncipe das trevas Trent Reznor, o amargurado Nine Inch Nails. Em contrapartida, as pinturas de Chagall e Redon ganharam identificação com a música de gente que entendeu que a melancolia podia ser leve, etérea e repleta de cores. Chagall saiu na frente do vocalista e compositor Wayne Coyne e ilustrou a história dos apaixonados que flutuam no espaço de “Do you realize?”. Redon acertou no branco faiscante ao pintar os próprios Sparklehorses (quadro aí de cima) e as aranhas artesãs que frequentam as canções iluminadas do Mercury Rev. Chagall, fazendeiro da pequena cidade de Vitebsk, destacou a importância de bichinhos domésticos no cotidiano das vidas que reproduziu em seus quadros. Os mesmos animais que hoje fazem companhia aos personagens entediados que sonham fugir dos cenários desoladores cantados pelo Grandaddy. E as esperanças, memórias e incertezas que borram os sonhos evocados pelo Secret Machines também aparecem borradas pelo giz de cera das telas embaçadas e líricas de Odilon Redon.
Entre Chagall e Redon, prefiro Chagall. Aliás, é meu pintor preferido.
Então serei parcial. No meio de punks, góticos, metaleiros, indies e emos....nós, apaixonados pelos delírios do Flaming Lips, pela mitologia de Mark Linkous, pela poesia folk do Grandaddy, pela guitarra chuviscada do Secret Machines e pelas fábulas cantadas por Jonathan Donahue, somos "chagais".
Pode ser?

1 comment:

nemo said...

não entendo nada de artes. mas estou começando a gostar desse tal de marc chagall. [aliás aquele sparklechagall é das coisas mais lindas que já vi].
...
"rock poeira de estrelas", "guitarra chuviscada" do secret machines ... demais. assim você acaba virando crítica da folha.
...
você merece algo melhor, claro.
...
acho que estou começando a prestar atenção às coisas.
...
marc chagall definitivamente combina com mercury rev. afinal
all is one. all is mind. all is lost and you find, all is dream
...
spidersandflies kisses