Wednesday, July 19, 2006

Os Dois Mares de Trapani e Hooverphonic




No extremo noroeste da Sicília, Itália, ocupando uma península, surge a pequenina cidade de Trapani. No mapa, o desenho de Trapani lembra um apêndice. Como se a ponta esquerda da Sicília afinasse e avançasse sobre o mar. Mas qual mar? Mares. O diferencial de Trapani está aí: a cidade é um muro natural que delimita dois mares. Tirreno ao norte e Mediterrâneo ao sul. Trapani é tão estreita que uma única rua interliga as duas praias. Então, a certa altura da calçada você pode olhar para um lado....e ver o Tirreno. Virar a cabeça e, em um segundinho, já se deparar com o Mediterrâneo. É divertido. Pode ser meio bobo mas, em Trapani, você se sente geograficamente muito bem posicionado no globo terrestre. Afinal, não é todo dia que a gente divide dois mares (melhor do que Moisés, que dividiu um). E a existência de dois mares não é notada apenas porque seus nomes estão escritos na "cartina". O Tirreno e o Mediterrâneo têm origem comum, mas estão longe de ser iguais. O Tirreno é muito mais lindo. Não sei a razão. Só sei que o mar do norte é azul anil, mesclado por correntes de água verde-esmeralda. Quando toca as rochas brancas - que na vida só vi em Trapani - compõe uma paisagem hipnotizante. O Mediterrâneo não é feio. A vista só não empolga. Cor de água de mar sem personalidade. Aquela água camaleônica que sempre reflete e imita a tonalidade do céu, até em dias nublados. O Tirreno captura o olhar. Desperta a vontade de ficar, de nunca ir embora. O Mediterrâneo casualmente entra no seu campo de visão, sem maiores estragos ou carimbos na memória. Não enfeitiça. É parar, reparar e....bom, está na hora de ir e tomar mais um sorvete.
O Hooverphonic é banda belga de trip-hop. Vocal feminino ultra-macio. Ano passado, foi lançado o CD mais recente da banda. Ou melhor, os CDs. Dois CDs em uma mesma caixinha. "Sweet Music" e "No More Sweet Music". As canções do primeiro disco são repetidas no segundo. Os mesmos nomes, as mesmas letras. Assim como as águas dos dois mares de Trapani, as músicas de ambos os CDs têm idêntica origem e estrutura. Mas o tratamento das canções e os arranjos são bem diversos. "Sweet Music" é o Tirreno: infinitamente mais arrebatador do que seu irmão descolorido. Por quê? Não consigo explicar. Talvez seja a mistura sutil e acertada de suave música eletrônica, música clássica e voz feminina. Em "No More Sweet Music" as canções foram remixadas. Os violinos, apagados. O vocal, recortado. Parece "chill out", bossa. Não é ruim, mas não empolga. Não captura os ouvidos ou o coração. "Sweet Music" torna seus ouvidos reféns. Provoca aquela deliciosa sensação de que sim, você finalmente encontrou as canções perfeitas. Apaixonante. Como o Tirreno.

Vá - ou retorne - para Trapani. E leve na bagagem os dois CDs do Hooverphonic. Se você escutar cada um diante do seu respectivo mar, vai me dar razão.

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