Na primeira vez em que ouvi "Never Forget You" no rádio - rádio mesmo, o aparelhinho, não estação on line - eu cheguei a pensar que havia feito as pazes com Amy Winehouse. Que a temporada no Caribe, o recheio siliconado nos peitos e no beiço, sei lá, alguma coisa tinha abençoado a moça e desencadeado um surto criativo. Que toda discografia chata daquela mulher finalmente encontrava redenção em uma música diferente, iluminada, com um pé fincado no swing dos anos 60 e outro neste século, um equilíbrio original e fresco entre R&B e pop rock. Eu não ouvi o locutor dizer o nome da canção e da cantora, mas aquele vocal feminino anasalado tinha cheiro de Amy. Então fui pro Google. Digitei um pedacinho da letra. E Amy, que já estava no meu purgatório pessoal aguardando confirmação para subir ao paraíso (e se sentar à direita de poderoso Lanegan), despencou outra vez para o inferno ao qual condenei artistas diabólicos que torturam meus ouvidos.
Shingai Elizabeth Maria Shoniwa é filha de uma humilde zimbabuana que imigrou para a Inglaterra. Cresceu com os irmãos em um conjunto habitacional no sul de Londres e, embora pobres, foram acostumados a escutar e a gostar de música. A mãe de Shingai insistiu para que toda a prole aprendesse a tocar um instrumento, se empenhou para juntar um dinheirinho, comprar discos de jazz e levar a criançada a shows. Shingai fez jus ao próprio nome, que significa "perseverança": trabalhou como atriz, artista circense, graduou-se em Artes. Até que em 2003 se uniu ao guitarrista Dan Smith e ao baterista Jamie Morrison, para ser a baixista e vocalista de uma nova banda: Noisettes.
Eu vi Noisettes há dois anos e meio, em Paris. Confesso que não dei muita pelota. Na época, eles haviam acabado de lançar o primeiro disco, com faixas de rock de garagem em que Shingai eleva a voz gritando para acompanhar a guitarra. Ao vivo, a banda lembrava uma cópia menos vigorosa da banda californiana BellRays, de punk rock e soul. O que é péssimo, pois os americanos tocam mais rápido, alto, melhor e têm Lisa Kekaula como vocalista. Não dá para comparar, não tem como Shingai competir com Lisa. Seria como jogar Michael Phelps e você numa piscina e esperar pra ver quem chega primeiro do outro lado (Lisa seria Phelps, óbvio, não você, lesma).
Tiro o chapéu para bandas que reconhecem suas limitações, não desistem de ser uma banda, mas....tentam algo novo. Mudar o tipo de som é uma sábia decisão. E eu fico imensamente feliz por Noisettes ter resolvido ser menos rock e mais pop. "Never Forget You", canção que está no novo CD da banda, "Wild Young Hearts", é um sopro de leveza e alegria. Foi produzida e escrita pelo próprio Noisettes. "Never Forget You" é pura homenagem às Supremes, grupo de garotas negras que foi a menina-dos-olhos da lendária gravadora Motown, de Detroit, entre 1959 e 1977 (sua integrante mais famosa era Diana Ross). Dá uma comparada no vídeo de "Chain Gang", das Supremes, e no clipe de "Never Forget You" (Shingai, linda, namorando um Porsche no início e vestida de diva do soul ao final). "Never Forget You" é a canção pop perfeita, com melodia catchy e letra sapeca que remete à inocência dos anos 60, época em que nossas mães davam trabalho para nossos avós ("We were mischievious/And you were always wearing black/I was so serious/You know my boyfriend's mother nearly had a heart attack"). Não tem como não escutar e não abrir um mega sorriso.
Presente de Ano Novo: "Never Forget You" para baixar. Canção sixties que não existia cinquenta anos atrás, mas que felizmente existe hoje, último dia de 2009, e que ainda vai existir quando chegar a década de sessenta deste século. E por todos os outros que também virão.
Dedico para todo mundo que passou por aqui durante esse ano.
E para você, Vovó querida.
Nunca Vou Te Esquecer.
2 comments:
Feliz Ano Novo, dona Ana Luisa!Tudo de bom nesse 2010, que promete muitas emoções por aqui, no Planalto Central.
Obrigada, Bacana, Feliz Ano Novo Eleitoral pra vc,ahahaha!
E já que vc. é "Nosso Homem em Brasília" manda aí uns boletins de fatos bizarros quando a coisa começar a pegar....pra eu e o Palma termos motivos pra rir (ou chorar) na hora do lanche atibaiense...:)
Bjs!
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