Friday, July 20, 2007

Concertos para a Juventude




Novembro de 2005, Barcelona Teatro Musical. Todos acomodados em suas poltronas, toca a campainha. O quarteto de cordas entra no palco. Toca durante cerca de uma hora. Termina a apresentação e se retira. De novo a campainha. Surgem os músicos principais, acompanhados do mesmo quarteto de cordas. O arco do violoncelo desliza no instrumento e a música começa. Durante quase duas horas, platéia quieta e paralisada. A noite é encerrada ao som frenético da Oitava. O público se levanta, palmas de profundo entusiasmo por vários minutos. Os músicos dão as mãos e inclinam as cabeças em agradecimento. Fim do espetáculo.

De Rock.

O local não era exatamente clássico. O Barcelona Teatro Musical é uma construção de arquitetura moderna, acústica perfeita. O público não era exatamente clássico: gente jovem, estudantes e turistas mochileiros de tênis nos pés. A banda de abertura não era exatamente clássica: Amiina, quatro bonecas islandesas que acrescentaram aos quatro instrumentos de cordas (primeiro violino, segundo violino, uma viola e um violoncelo) um piano digital, sintetizador e computador que produzem melodias eletrônicas. Os músicos principais não eram exatamente clássicos: Sigur Rós é banda de rock nascida na gélida e escura Islândia. O concerto não foi exatamente clássico: imagens eram reproduzidas em telão, luzes multicoloridas irradiavam do palco; o arco do violoncelo deslizava em uma....guitarra. E o gran finale não foi exatamente clássico: a apoteótica música não foi uma Oitava Sinfonia composta por algum célebre compositor, e sim a Oitava faixa do álbum sem-nome "( )", do Sigur Rós.
No século XXI, o Sigur Rós não respeita certos padrões do rock. Suas canções, por exemplo, não têm refrões. Quando há voz, ela é aguda, em falsete...um lamento do guitarrista Jónsi Birgisson, que canta em uma língua....que não existe. O Sigur Rós ousa sem medo. Da mesma forma que, no século XIX, um alemão também ousou. Ludwig van Beethoven não respeitou certos padrões da música clássica. Introduziu um coral em uma de suas composições e assim criou a primeira sinfonia da História a utilizar voz humana. A famosa Nona Sinfonia.
O austríaco Wolgang Amadeus Mozart não foi tão genial quanto Beethoven. Mas sabia compor com emoção inigualável. Impressionado, o também compositor Franz Schubert chegou a dizer: "na Sinfonia em Sol Menor de Mozart, pode-se ouvir o canto dos anjos". As melodias do Sigur Rós também são comoventes. O último disco da banda, o elogiado "Takk", mistura a guitarra distorcida pelo arco do violoncelo ao som clássico de um quarteto de cordas impulsionado pela tecnologia. A voz invernal e solitária de Jónsi dá força às canções. Não é propriamente a voz de um anjo, mas certamente possui um timbre que não parece humano.
A apresentação do Sigur Rós, aquela noite em Barcelona, não foi apenas o melhor show da minha vida. Foi um dos melhores e mais sublimes momentos da minha vida. E acredito que também tenha marcado a existência das várias pessoas que lotaram o teatro, um público completamente heterogêneo: basicamente jovens, mas pais de família também. Número de estrangeiros sensivelmente maior do que de catalães: antes do show, conversas em inglês, alemão, francês e idiomas por mim desconhecidos se confundiam na platéia; todos esperando para ouvir música enriquecida por palavras pronunciadas em uma língua que não existe...
O Sigur Rós já tocou aqui em São Paulo, em 2002 (se não me engano). O show passou batido. Culpa do local (uma tenda armada. Acústica sofrível, clima desprovido de charme). Culpa dos presentes (que batiam papo em diversas rodinhas, desinteressados e na espera pelo Belle & Sebastian, atração da noite). Culpa da banda (o show foi baseado nas faixas dos seus primeiros CDs: sonolentas). Mas os islandeses mudaram. As guitarras, a colaboração das instrumentistas do Amiina, a influência (positiva) de uma grande gravadora reconstruíram o som do Sigur Rós. Torça para que eles voltem a se apresentar no Brasil (em um esquema decente). Se você tiver condições financeiras, vale a pena abrir o Atlas, conferir o roteiro da próxima turnê da banda (que por ora não está excursionando, preparando o novo CD) e ir atrás! Vai compensar cada dólar, libra ou euro gasto, eu prometo.
Sigur Rós, ao vivo, não é um show de rock, não é um concerto moderno. É muito mais.
É uma experiência assustadora.

3 comments:

Cris Ambrosio said...

Eu não curto muito música eletrônica, mas esse cara do Sigur Rós definitivamente ouve Led Zeppelin: http://www.gibson.com/Files/AllAccess/2007/News_Images/Jimmy-lp-w-bow.jpg

Bjs!

Anonymous said...

Sempre ouvi falar bem do Sigur Rós, mas nunca escutei nada.
Acho que agora vou prestar mais a atenção nessa banda.


Eu também, levou muito em conta a possibilidade de ver bons shows quando penso em viajar. Ainda mais vivendo no Brasil, lugar em que No pasa nada!

marcio castro said...

sinto saudades do free jazz. tinha as bandas modinhas também ,mas trazia algumas coisas mais alternativas. e belle e sebastian é bom também né? mas era mais modinha. mas nada comparado ao killers no TIM.

saudades do free jazz.