Friday, January 08, 2010

Herói Sem Máscara

Pausa na retrospectiva de 2009 - vou postar o texto do Robert Downey Junior que foi publicado mês passado na revista Movie, tá. Minha versão original. Agora saiu quase na íntegra também no site da revista, todo bonitão, cercado por fotos, vídeos e com a listinha de bizarrices e curiosidades que descobri sobre o moço. Vai lá. E volta aqui. Ou lê aqui e vai lá.
Foi em 1970 que Robert Downey Senior entregou ao filho, nascido cinco anos antes, o presente insólito. Um papel. O primeiro papel de Robert Downey Junior como personagem em um mundo inédito, fascinante, de sonhos fabricados. Era o início precoce no cinema. Aos oito anos de idade o ator mirim foi de novo presenteado pelo pai diretor. Outro papel, bem diferente do anterior. Enrolado, trazendo um recheio inusitado: maconha. O primeiro papel do garoto novaiorquino como personagem um mundo também desconhecido e atraente, mas doloroso, de pesadelos tóxicos. Era o início precoce no vício.
Estúdios, bastidores, cenários e câmeras viram Robert crescer. Sua formação incluiu até mesmo aulas de ballet. Teen, marcou presença em comédias assinadas por John Hughes. Adulto, duas disputas ao Oscar: em 1993, por melhor ator graças à personificação magistral de Charles Chaplin em Chaplin; este ano, para melhor coadjuvante por roubar a cena no hilário Trovão Tropical, irreconhecível no papel de um negro. São mais de 60 filmes em 36 anos de carreira, cinco dos quais ele conciliou trabalhos na TV: na série Ally McBeal, ele também canta, improvisando covers de canções de Bruce Springsteen, The Police.
Tamanha produtividade já impressionaria se Downey Jr. fosse o tipo de astro centrado, disciplinado, moço certinho. Como Tom Cruise. Não é. Se a extensa filmografia de Robert é capaz de intimidar o ator veterano mais experiente, sua ficha policial surte igual efeito em qualquer rock star explosivo e descontrolado. Dependente químico, por anos alternou estúdios e sets com rehab, delegacias, tribunais, prisão. Detido por posse ilegal de arma e drogas, peitou ordens judiciais, violou condicionais, foi flagrado dirigindo seu Porsche, bêbado – e pelado. Criou constrangimentos para diretores, elencos: nas filmagens de US Marshals, foi vigiado por oficial de justiça e companhia de seguros. Sua urina era colhida e testada de três em três horas para que fosse detectada a possível presença de substâncias ilícitas.
Claro que Downey Jr. não foi o único ator de sua geração a mesclar fama e encrencas com a lei. Mickey Rourke agrediu a mulher e foi preso; câmeras gravaram Winona Ryder furtando uma loja. Após esses vexames, ele deu um tempo na carreira para se dedicar ao boxe, ela fugiu dos holofotes. Robert ficou, provando que é a antítese do iron man: um ser de carne e osso cujo corpo doente nunca se beneficiou da proteção de uma carapaça metálica para evitar seu pior vilão: o próprio ator. O herói revelou sua fraqueza, seu sofrimento, seus defeitos para o público e mídia com o rosto exposto. Sem máscara.
Em 2003, Robert reconheceu seu ponto de saturação. Manter uma carreira (senão de sucesso, ao menos estável), a proximidade dos amigos e de Indio, o filho hoje adolescente, reconquistar a confiança de cineastas e produtores: boas razões que pesaram para o adeus definitivo dado às drogas. Durante as filmagens de Na Companhia do Medo, Downey Jr. conheceu Susan Levin. Robert estava se divorciando da mãe de Indio. Comentando o filme tempos depois, ele afirmaria que sua melhor lembrança do set era ter xavecado – e ganhado – a produtora. Mas Susan foi taxativa: não se relacionaria com um viciado. A reação de um Robert apaixonado veio sob forma de canção. Em 2004 foi lançado The Futurist, único álbum do ator que compôs melodias e escreveu letras para oito baladas com tom folk. “Se você acha que sou apocalíptico, ou frio e obscuro...por favor, nunca vá embora”, a voz suave de Robert confessa e implora na triste Little Clownz. Susan atendeu a súplica. E qual namorada abandonaria um cara que lhe dá, de presente de aniversário, um pedido de casamento e na noite do Oscar a apresenta às emissoras de televisão anunciando: “esta é minha eterna mulher”?
Aos 44 anos, Robert é o astro carismático plenamente comfortable in his own skin – à vontade na própria pele. Nas telas, sua atuação é tão desenvolta, natural e segura que transmite a sensação de que, mesmo após o grito de “corta!”, o personagem sai do set e continua a existir na realidade. A escritora Anne Rice o quer como vampiro Lestat na continuação de Entrevista Com O Vampiro, Hugh Hefner disse que ficaria honrado se Robert o interpretasse em seu filme biográfico (e há algo mais cool do que ser solicitado pelo próprio e lendário criador da revista Playboy?). Homem de Ferro 2 está a caminho e Sherlock Holmes tem tudo para ser o blockbuster do verão: no filme, o detetive mais famoso da literatura é boêmio, brigão, mulherengo e se veste com trajes vitorianos inspirados no rolling stone Brian Jones. E Robert empresta ao personagem seu traço mais charmoso: aquele sorriso um tanto sarcástico, meio safado, 100% sedutor que se insinua quando o ator ergue as sobrancelhas. Irresistível.
Drug-free, Downey Jr. vem sendo agraciado com todas as honrarias pop dignas de um astro que se firmou na indústria mais competitiva e imprevisível do universo das artes. Cravou sua estrela na calçada da fama, é medalha de bronze na lista deste ano da revista Empire que elegeu os 100 sexiest movie stars (atrás de Robert Pattinson e de Johnny Depp, o campeão), virou peça de museu: um clone de cera está ao alcance dos fãs no supervisitado Madame Tussauds em Hollywood. No ano em que a séria e tradicional Academia de Cinema preferiu prestar uma homenagem ao falecido Heath Ledger, concorrente de Robert, a descolada Academia de Ficção Científica, Fantasia e Filmes de Terror sentenciou: Robert Downey Jr. é o melhor ator de 2009 por Homem de Ferro. E se o Oscar 2009 não sorriu para Robert, não será Robert que provocará sorrisos e risos no Oscar 2010: “não, obrigado” foi a reposta ao convite para ser o apresentador da próxima cerimônia. Lógico. A ambição máxima do ator não é subir no palco para ter visão privilegiada de seus colegas (não raro, gente de talento inferior ao seu) faturando prêmios. Robert quer mais. Quer, sim, descer do palco segurando uma estatueta dourada. A dele. E ele sabe – como nós também sabemos - que está muito perto de conseguir. Óbvio. Os super heróis sempre vencem no final.

2 comments:

Iago Nascimento said...

Ah!,passei mesmo para cobrar a resenha do Show do Soulsavers & Mark Lanegan.Já é quarta-feira!,e promessa é divida!,ainda mais no brasil!!! hahaaha

Pode ficar tranquila que as visitas no blog são "recreativas"

Me divirto!

Por Quê você que ser a Ana Maria Braga?

Haha

Galaxy Of Emptiness said...

Calma, he. Não é assim, a inspiração tem que vir pra eu conseguir escrever, ahaha.

Ana Maria Braga é poderosa, escrevi lá no post sobre suas façanha, rs!