Saturday, May 31, 2008

Quando a Arte vira Rock, Parte CXXVII



Estátua do imperador Júlio César e....Mark Lanegan.
É, de novo.

Tuesday, May 27, 2008

Nestor Pestana belga


Rue de la Putterie, Bruxelas.


Em francês e holandês, para não deixar dúvidas.

Sunday, May 25, 2008

Vengeance is Mine, Inc.




Em Londres, a família de uma parteira é ameaçada de morte por membros da máfia russa. Dentro de uma sauna, integrantes de uma gangue tchetchena tentam matar, a facadas, um capanga russo. Foram induzidos a acreditar que ele é herdeiro do homem que comanda o crime organizado russo na capital inglesa. O rival russo tem a pele tatuada como prova de lealdade a seus chefes. E mantém guardado um segredo.

Na Tchetchênia em guerra com a Rússia, um presidente separatista é assassinado por dois mísseis teleguiados atraídos pelo sinal de seu telefone celular. Ele conversava com um deputado russo e discutia a iniciativa de paz.
Também em Londres, um ex-agente secreto russo bebe chá em um hotel. Sem saber, é envenenado por elemento radioativo com capacidade para destruição semelhante à de uma bomba atômica. A vítima, exilada política e então casada com uma linda dançarina, contamina a cidade até ser internada em hospital e morrer. Mas deixa uma carta revelando o nome do mandante de seu próprio homicídio. O presidente da Rússia.

Duas tramas. Mirabolantes. Encenadas por cidadãos russos que levaram o dever de fidelidade às últimas conseqüências. Repletas de ameaças veladas, conspirações, disputas pelo poder. A vingança materializada na lâmina que abre uma garganta. Ou no veneno que devasta as células de um corpo. Duas tramas que percorrem o mesmo tema: crime organizado russo. Mas que diferem em suas origens. A primeira, ficção, foi registrada por David Cronenberg: "Eastern Promises" ("Senhores do Crime"), filme que tem como personagem central um mercenário - interpretado de forma magistral por Viggo Mortensen (foto à direita) - disposto a matar e a marcar a própria pele para provar sua lealdade à máfia russa em Londres. A segunda foi registrada pelos jornais nos últimos anos (incluindo a sensacional reportagem transmitida pela TV Globo http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM687208-7823-LIVRO+ACUSA+O+PRESIDENTE+DA+RUSSIA+DE+ASSASSINATO,00.html ): a vida real do ex-espião russo Alexander Litvinenko, que se dispôs a morrer, e a colocar parentes e amigos sob risco, para provar ao mundo que a alta cúpula do governo russo era responsável por atos de terrorismo.
Alexander Litvinenko, apelidado Sacha, ingressou no serviço secreto antes do colapso da União Soviética em 1991. Era a KGB, central da inteligência soviética. Sacha organizava arquivos secretos sobre marginais, estudava seus assuntos pessoais, redes, contatos com empresários e políticos. Trabalhava nos bastidores, desvendando planos de corrupção através de escutas telefônicas clandestinas, recrutando e comandando agentes infiltrados em gangues.

Fim da União Soviética. Boris Ieltsin assume o comando da Federação Russa. Não mais KGB; a inteligência russa é agora concentrada no FSB. Litvinenko continua a servir sua pátria, que então enfrenta uma nova era: a da liberdade. Liberdade de circulação, liberdade de imprensa, liberdade de mercado. Com as privatizações, empresários enriquecem. Um deles é o poderoso milionário Boris Berezovski, amigo de Sacha. Berezovski gozava de muita influência no governo Ieltsin. Graças a ele, um antigo oficial da KGB é nomeado chefe do FSB: um homem de origem humilde, filho de operários, que viveu infância pobre e adolescência rebelde, marcada por brigas de rua, ameaça escolar, más companhias. Um professor conseguiu afastá-lo da delinqüência, ensinando-lhe artes marciais. O judô deu disciplina, concentração e habilidade tática ao rapaz. Segundo o treinador, o jovem lutava como um leopardo decidido a vencer a qualquer custo. Continuou a praticar o esporte quando começou a aprender o ofício de espião. Vladímir Vladímirovitch Putin era seu nome (foto à esquerda).
Trabalhando no FSB, Sacha descobre um esquema de corrupção e um plano para matar Berezovski. Vai até Putin e delata a conspiração. É tratado com extrema frieza. Putin o considera desleal aos companheiros de serviço. Após o encontro, Sacha comenta com Marina, sua esposa: "Conheço um homem pelo aperto de mão. O dele era frio e pegajoso. Eu podia ver em seus olhos que ele me odiava". Litvinenko recorre à televisão. Ao lado de quatro agentes mascarados, escancara publicamente as ilegalidades cometidas por gente do FSB. Cai em desgraça com Putin, é preso.
Terminando o segundo mandato presidencial, Boris Ieltsin necessita de um sucessor. O homem escolhido para concorrer às eleições é Vladimir Putin. Em 1999, áreas residenciais de Moscou são alvos de bombas. Os tchetchenos separatistas são apontados pelo governo como sendo os responsáveis. Investigações que apuram um possível envolvimento do próprio FSB são abafadas. E Putin torna-se presidente da Rússia.
Sacha é solto, mas sabe que tem a inimizade do homem mais poderoso do país. Litvinenko, esposa e filho fogem para a Turquia. Ajudado por um cientista russo trabalhando para o empresariado americano, tenta negociar asilo político junto à embaixada dos EUA em Ancara. É descoberto pelos russos, que enviam espião para vigiar o ex-agente no hotel em que se hospedou (o capanga chama a atenção por se esconder atrás de um jornal aberto - clichê cinematográfico que Sacha logo identifica). Os russos tentam impedir que Sacha saia da Turquia, mas fracassam. A familia fugitiva consegue embarcar em avião e aterrissar na Inglaterra, onde é acolhida e sente-se segura. Ilusão.
Em Londres, Litvinenko descobre, da forma mais dolorosa e inimaginável, que continuava sob os olhares do Kremlin. Em novembro de 2006, Sacha se encontra com Andrei Lugovoi, ex-chefe de segurança de Boris Berezovski. Não desconfia que a missão de Lugovoi é assassiná-lo. Não nota quando, conversando com seu compatriota no bar de um hotel, ingere veneno que havia sido despejado em um bule de chá. Depois do encontro, o dissidente russo começa a sentir-se mal. Vomitando, é internado. Os médicos não conseguem identificar a causa. Inicialmente, suspeitam da ação de bactérias. Quando Litvinenko começa a perder o cabelo, é levantada a hipótese de envenenamento. Inicia-se uma corrida contra o relógio: identificar a substância tóxica e medicar Sacha a tempo de salvá-lo. Mas Litvinenko sabe que já está morto: mesmo debilitado e tomado por intensa dor causada pelo veneno que dizimava seus tecidos, atende a imprensa e a Scotland Yard, fornecendo à polícia todas as valiosas informações que eventualmente pudessem incriminar o executor de seu homicídio. E estabelecer a ligação com o homem que teria dado a ordem de extermínio. Segundo Sacha, Putin.
Polônio-210 foi o elemento radioativo que em questão de dias matou Alexander Litvinenko. Sua produção ocorre em laboratórios russos controlados pelo governo. É caro e inacessível para assassinos comuns. E nunca havia sido usado para exterminar um ser humano. Embora inofensivo para quem o manipula, uma vez engolido ou inalado não dá à vítima a mínima chance de sobrevivência. Um grama é suficiente para matar meio milhão de pessoas. Médicos afirmaram que Litvinenko recebeu uma dose equivalente a estar no epicentro da catástrofe de Tchernobil...por duas vezes. Os assassinos de Sacha apenas não contavam que o organismo do ex-agente fosse resistir tanto, a ponto de permitir que médicos e peritos estudassem o caso e identificassem o veneno. Em entrevista, o pai do ex-agente disse que o filho havia sido morto por uma "minúscula bomba nuclear". Atualmente, a viúva Marina Litvinenko luta para que todos os implicados na morte de seu marido sejam apontados e punidos. Putin nega veementemente o envolvimento no crime.

"Vengeance is Mine, Inc." é nome de um dos contos escritos pelo britânico Roald Dahl (1916-1990). Comparsas abrem uma empresa que oferece a seus clientes serviços de vingança. Trama sinistra publicada na coletânea "More Tales of The Unexpected".
A trama sinistra que levou à morte de Litvinenko está no livro "Morte de um Dissidente", de Alex Goldfarb e Marina Litvinenko. História real e surpreendente, muito além da força criativa de roteiristas cinematográficos e escritores de ficção.

Friday, May 09, 2008

Black Postcards: a Rock & Roll Romance





"Rough Trade landed us a run of shows supporting the Sundays in the U.K. The Sundays was a pop band from Bristol, whose debut album was at number four on the charts - the real charts, not the fake independent ones."

Página 81. É na página 81 que por acaso abro o livro escrito por Dean Wareham, exposto na livraria de língua inglesa localizada em uma rua movimentada de Bruxelas. Leio o trecho que copiei logo acima....e não é preciso mais nada para que uns bons - e muitíssimo bem gastos - euros migrem da minha bolsa em direção à caixa registradora.
"Black Postcards: a Rock & Roll Romance" é a recém-lançada autobiografia de Dean Wareham, músico nascido na Nova Zelândia em 1963 (e ainda vivinho da Silva). Dean é compositor, guitarrista e vocalista. Conhecido no meio alternativo como ex-membro de duas grandes bandas, já falecidas: Galaxie 500 e Luna. O tema central do livro - uma delícia! - é justamente esse: Wareham conta, de maneira divertida e sarcástica, que ser "conhecido" no meio alternativo na maioria das vezes significa ser ignorado pela massa de ouvintes, consumidores de música. E que ser integrante de uma "grande banda" raramente é sinônimo de ser integrante de uma "banda grande".
Depois de passar a infância, início da adolescência em seu país natal e Austrália, Dean mudou-se para Nova Yorque em 1977. É lá que Wareham toma contato com o punk e pós-punk. Foi testemunha presencial de Ramones, Blondie, Clash, Gang of Four se apresentando nos clubes mais bacanas da cidade. Dean cursou a Universidade de Harvard, onde também estudaram Damon Krukowski e Naomi Yang. Em 1986, os três se uniram para criar o Galaxie 500, banda de canções suaves e melancólicas. Dean na guitarra, Naomi no baixo, bateria para Damon. Bom, eles não sabiam tocar. Mas...who cares? Dean, não. "Mary Harron wrote that rock and roll 'is the only form of music wich can actually be done better by people who can't play their instruments than people who can'".

Gravando demos, tocando em pequenos clubes e assinando contrato com uma minúscula gravadora, o Galaxie 500 tentava conquistar seu espaço. Vieram então boas críticas publicadas como pequenas notas em conceituadas revistas inglesas (a banda sempre foi mais querida no Reino Unido do que nos EUA), a admiração externada por Sonic Youth (outra banda indie, mas já estabelecida), o contrato com nova gravadora, três discos lançados, turnês...e só. O Galaxie 500 nunca estourou. Sem um pingo de amargura ou frustração, Dean narra diversas situações embaraçosas ou divertidas, experimentadas por alguém que jamais atingiu status de rock star a ponto de destruir quartos de hotéis, fugir de fotógrafos ou compor em estúdios guarnecidos com piscina e quadra de tênis. Um dia, representante da gravadora Geffen marcou encontro com Dean e o casal Damon/Naomi, aparentemente interessado no som do trio. Faltou ao compromisso, sem maiores explicações. Wareham depois descobriu que o foco de interesse do empresário havia mudado: preferiu contratar outro trio. Nirvana.

"Você tem banda!?", espantou-se uma colega de trabalho de Dean. "Ah, então não deve ser conhecida". Atitudes de desprezo, ou até mesmo mesquinhas, também partiam de outras bandas alternativas...Wareham revela que a dupla Sundays impôs várias condições para que o Galaxie 500 não se destacasse durante shows da turnê conjunta. Entrega que nem todos os artistas e selos independentes vivem "para" a Música. Condena aqueles que vivem "de" Música (segundo Dean, no mundinho alternativo a banda Jesus and Mary Chain recebeu o apelido de...Jesus and Money Chain...). Wareham explica que é errada a idéia de que as gravadoras e selos independentes não exploram ou enganam artistas inocentes e sem grana (Dean dedica duas páginas do livro para esculachar Steve Albini, produtor de discos dos Pixies e Nirvana. Albini repreendeu a onda de músicos independentes que, nos anos 90, ousaram assinar contratos com grandes gravadoras). A ambição saudável de Wareham - que também queria um contrato com gravadora que não operasse sob eterno risco de concordata - foi uma das causas de sua saída (e do fim) do Galaxie 500. Dean se queixava que Damon e Naomi, namorados, sempre venciam quando assuntos de interesse da banda eram colocados em votação. Afinal, os votos dos dois eram idênticos (e, em um trio, a maioria). Wareham, ressentido, passou a chamá-los de "Gang of Two". Em 1991, convocou outros músicos e criou o Luna, que teve vida longa: oito discos.

Wareham é humilde e lúcido. Conta que respondia educadamente as perguntas de jornalistas que, nos anos 80, queriam saber sua opinião sobre Pixies. Nos anos 90, sobre as bandas do movimento shoegaze e grunge. E, no novo século, sobre Strokes e White Stripes. O interesse no seu próprio som geralmente era secundário. Ou então vinha de fanzines obscuros: "It was odd playing to an audience of eleven, and then being interviewed as if anyone cared what we had to say about anything. Such is the world of indie rock."
No livro, Dean dá uma verdadeira aula a respeito das dificuldades e apertos financeiros que um artista independente sofre. Gravadoras pagam aos músicos uma soma adiantada, para gravação de discos (os contratos dispõem sobre quantos álbuns devem ser lançados, em quais intervalos de tempo), vídeos, despesas com publicidade e turnês. Cabe então à banda corresponder às expectativas da contratante, vendendo CDs de modo a restituir o dinheiro investido. Além, logicamente, de arcar com o gordo desconto da porcentagem cabente à empresa sobre vendas de discos. Resumindo: a maioria dos artistas não consegue uma boa resposta do mercado. Torna-se devedora de milhares de dólares. O jeito....sair em turnês. Dormir em hotéis que são espeluncas. Tocar em buracos, para público ínfimo (Dean conta que chegou a se apresentar em um "clube" que era também uma...lavanderia!! Levando roupa para lavar, o cliente ganhava um desconto no ingresso para o show!). E torcer para vender um significativo número de camisetas depois das apresentações (descontado o valor devido ao estabelecimento no qual rolou o show e foi montada a "lojinha" do artista).
As melhores histórias do livro são aquelas que Dean descreve como sendo suas aventuras em turnês (ao final da biografia, Wareham agradece ao pai por aconselhá-lo a sempre tomar notas em suas viagens). O Luna excursionou pelos EUA a bordo de um ônibus caindo aos pedaços, que havia pertencido ao cantor country Willie Nelson. É hilário o capítulo em que Wareham conta que, como passatempo, a banda brincava de "Who would you open for" e "Who would you fuck": um dos rapazes do Luna citava o nome de um artista, alternativo ou não. Billy Corgan, por exemplo. Aí os demais comentavam se o Luna abriria um show do Smashing Pumpkins ou....bem, traduza você.
Embora ferrado e mal pago, Dean conheceu boa parte do mundo graças às turnês. Fala de seu imenso carinho pela Espanha: comida, gente bonita, muitos fãs do Luna, drogas. E não economiza comentários ácidos sobre lugares que detestou. Menciona frase genial de Mark Twain para deixar bem claro que em Cincinnati, nos EUA, a vida passa em câmera lenta: "When the end of the world comes, I want to be in Cincinnati, because it's always twenty years behind the times." O Luna esteve no Brasil, em 2001. Wareham lembra que, em São Paulo, a banda tocou ao vivo em um programa noturno da rádio Brasil 2000. Era o Garagem!!
O Luna se desfez em 2004, sem brigas. Dean estava cansado da rotina "compor em estúdio/gravar/sair em turnê". E havia Britta Phillips, a baixista. Causou desconforto na banda o caso de Dean e Britta. Dean era casado e pai de um menino pequeno quando se apaixonou pela linda Britta (parecidíssima, aliás, com outra Naomi: a não menos linda Naomi Watts, atriz de cinema). Os dois passaram a compartilhar quartos de hotéis durante as turnês. Quando a mulher de Wareham descobriu a relação, exigiu que Britta fosse dispensada da banda. Dean então narra a culpa e a angústia que suportou durante dias, dias que ele denominou como sendo os piores de sua vida. No final, escolheu Britta. Divorciou-se. Hoje, o novo casal é a dupla "Dean & Britta", que ainda segue a linha de canções "dream pop" do Luna.
"Black Postcards: A Rock & Roll Romance" é narrativa hipnótica que vai muito além das memórias de seu autor. Como bem sintetiza a resenha impressa no próprio livro, "Black Postcards is rich in rewards for anyone who has ever been in a band or just taken an interest in indie music over the past twenty years. Black Postcards is also about what it's like to pretend to be civil as you answer the same helpful question over and over again: 'Why aren't you guys more famous?'"

Friday, May 02, 2008

Quando a Arte vira Rock, Parte CXXVI



Escultura de autoria desconhecida (por mim) e Wayne Kramer, guitarrista do MC5.