Monday, February 09, 2009

God only Knew





"Oh my Lord don't you bother me/I'm as tired as a man can be" ("Pendulum", Mark Lanegan).


"Trouble comes in slowly/A neverlasting light comes to shine all over me/Bright in the mornin'/ Like all of heaven's love comes to shine on me/And to you who never need/Fuck yourselves, I need some more room to breathe.
Here comes the devil, buy the round/One whiskey for every ghost /And I'm sorry for what I done/Lord it's me who knows what it costs." ("Borracho", Mark Lanegan).

Será que ele lembrou? Quinze anos completos.

No dia 18 de janeiro de 1994, foi finalmente lançado "Whiskey for the Holy Ghost", segundo disco da carreira solo de Mark Lanegan. Ele se lembra daqueles tempos? Nada fáceis. Tempos de implorar para que Deus, os anjos, o Espírito Santo, o demônio....e Jack Endino o deixassem em paz. Foram os anos da heroína. O auge do vício. A gravação de um álbum que se arrastou por três anos, com quatro trocas de produtores. Jack Endino, que já havia trabalhado com o Nirvana, foi um deles. Se não fosse a intervenção de Endino, um Lanegan fora de si teria destruído todo o material gravado. Incluindo "Borracho", canção iniciada com uma voz pastosa, arrastada, em tom confessional que gradualmente acelera, cresce e...explode em desespero. "Borracho" é a condenação, a autopenitência, a humilhação de um homem que pede desculpas a Deus, pois não tem mais nada a oferecer além de...um brinde vacilante com um copo de álcool. Ouvir "Borracho" causa aquela sensação de angústia e impotência que aperta o peito quando a gente vê um bicho muito ferido, mas que ainda luta para sobreviver. É a música de uma época. De um Lanegan que nem existe mais, depositário de uma dor que só Deus realmente conheceu e testemunhou. De um Lanegan que morreu no dia 18 de janeiro de 1994.
E que ressuscitou no dia seguinte. Quinze anos antes. Quinze anos antes do show que vi em 19 de janeiro deste ano, na Union Chapel de Londres.
Naquela noite, Lanegan enfim estava perto dos anjos. Sobre sua cabeça, oito anjos em roda, tocando instrumentos de vidros coloridos. Mark Lanegan em uma igreja. Lugar que um dia ele pensou ser indigno de pisar. Durante o show - uma parceria com Greg Dulli - Lanegan não cantou "El Sol", outra faixa do esquecido WFTHG. "The sun is gone, and that's all I really know/no angels in the air/with hearts as good as gold/the closer you stand to the gates/the more the gates are closed". É, não havia mais sol. Mas os anjos estavam lá, as portas abertas (apesar do frio). E um Mark Lanegan, como sempre, humilde. Os mesmos movimentos contidos, o eterno desconforto, os olhos baixos. Chris Cornell, do Audioslave, foi certeiro ao definir o amigo em uma entrevista: "He's too uncomfortable in his own skin". Pois é. A impressão é de que Mark Lanegan deseja constantemente a invisibilidade. Para ser só voz. E é a voz sublime de Mark que inunda a platéia sentada nos bancos de orações e flutua pela nave da igreja vitoriana em estilo gótico. Que sobe pelo gigantesco pé-direito do hall, esbarra nos anjos transparentes dos vitrais, é absorvida pelas paredes que o arquiteto James Cubitt projetou em 1874. Que encosta no teto reformado graças às doações e ao dinheiro arrecadado com shows, sai pela torre danificada pelos bombardeios da Segunda Guerra....e se dissolve na noite gelada de Londres. Lanegan ao vivo, em ambiente sacro, é incorpóreo. É voz etérea e quase branca que perdeu o fardo negro e feio de anos, e anos, e anos atrás.

Será que ele se lembra de 18 de janeiro de 1994, em Seattle?
Na frente dele, após o show, não tenho coragem de perguntar. Mas tenho coragem para perguntar sobre outra data. Não tão remota. A data de um show em Lisboa. "I remember you", ele responde, voz baixa, pausada. E o olhar cuidadoso é de pergunta. "De novo? Mereço?"

Merece. Sempre.
Cheers, man.

Tuesday, February 03, 2009

Quando a Arte vira Rock, Parte CXXXIX



Portrait of Roman Laskowski, de Konrad Krzyzanowski (1872-1922), e Robert Smith, vocalista do The Cure.

Sunday, February 01, 2009

Falência Múltipla

Piccadilly Circus é o Centrão de Londres. A Sé dos caras. E o centro do Centro - ou seja, de Piccadilly - é aquela pracinha/rotatória sobrevoada por Eros. Tudo a ver: a estátua de um cupido paira sobre o Coração da cidade. E o anjinho alado aponta seu arco para o núcleo desse Coração de Pedra e Vidro. Um prédio na esquina com a Regent Street. O prédio da Virgin. O prédio que foi da Virgin, loja de CDs que fechou depois de ter lutado pela sobrevivência sob novo nome, Zavvi. A Zavvi também encerrou suas atividades. O local está lacrado, as vitrines estão cobertas por papelões. Vi há umas semanas. Mais ao lado - na área que seria o Pulmão londrino - a loja HMV tenta respirar. Todos os dias aberta até meia-noite. Comprou a independente Fopp, perto dali, em uma artéria, digo, travessa, da Charing Cross.

Fiquei encantada no dia em que me liguei que o coração do Coração da cidade mais musical do planeta era...uma loja de discos. E agora o coração de Londres parou de pulsar rock.
E o meu ficou apertado.
(Consolo: com o fechamento do comércio musical, acaba o risco da gente entrar em uma loja e dar de cara com o Morrissey pelado em uma capa de single. Pirou, tio? Tímido? Não mais. Mas continua criminosamente vulgar.)